
Resinagem no Pinheiro-Manso: primeiros ensaios apontam compatibilidade com a produção de pinha
Investigadores testam viabilidade de explorar simultaneamente resina e pinha, com resultados preliminares que indicam ausência de impactos negativos significativos, embora persistam ainda desafios técnicos e logísticos.
A possibilidade de associar a resinagem do Pinheiro-manso à produção de pinha – uma das fileiras mais emblemáticas da silvicultura mediterrânica – tem vindo a ganhar relevância no debate científico e setorial.
Na recente sessão sobre a resinagem do pinheiro-manso no Alentejo Litoral, promovida no Cineteatro Grandolense pela Associação de Produtores Florestais do Vale do Sado (ANSUB) aProfessora Paula Soares, do Instituto Superior de Agronomia (ISA) apresentou os resultados de ensaios de campo iniciados em 2017, concluindo que, até ao momento, “não há evidência clara de que a resinagem comprometa a produção de pinha ou a qualidade do pinhão”.
Segundo dados do Inventário Florestal Nacional, a área de pinhal-manso em Portugal aumentou de 120 mil hectares em 1995 para 193 mil hectares em 2015, consolidando-se como espécie-chave, sobretudo no Sul e na faixa litoral. “Este crescimento é significativo e obriga-nos a repensar o papel do manso não só como produtor de pinha, mas também como potencial fornecedor de resina”, destacou a académica.
Desafios de densidade e logística
Apesar do potencial, Paula Soares alertou para desafios estruturais. “A densidade dos povoamentos é um fator crítico. No pinhal-bravo, a maior densidade permite maior produtividade ao resineiro. No manso, os maiores espaçamentos obrigam a deslocações mais longas e reduzem a eficiência.”
A própria estrutura da copa representa outra limitação, pois ramos mais grossos dificultam a preparação do fuste e encarecem a desramação, exigida por lei para autorizar a resinagem.
A isto junta-se a necessidade de renovas frequentes, em ciclos de 15 a 21 dias, o que implica deslocações regulares a parcelas muitas vezes afastadas das unidades de processamento. Como explicou Paula Soares, “não basta instalar os potes ou sacos; é preciso garantir visitas regulares ao longo da campanha”. O transporte da resina em bidons até à fábrica agrava ainda mais os custos logísticos, influenciando a rentabilidade.
Finalmente, os solos arenosos onde se encontram muitos dos povoamentos de pinheiro-manso dificultam a movimentação dos resineiros contribuindo para uma menor produtividade do trabalho.
Ciclo reprodutivo prolongado
Do ponto de vista biológico, o Pinheiro-manso apresenta especificidades que dificultam a avaliação imediata. A fecundação só ocorre dois anos após a polinização, e a pinha apenas atinge maturação no terceiro ano. Assim, eventuais efeitos da resinagem só podem ser avaliados após ciclos longos.
“Não podemos tirar conclusões precipitadas. São necessários ensaios de maior duração e com maior número de árvores para confirmar a ausência de efeitos significativos”, frisou Paula Soares.
Primeiros resultados após quatro anos
Os efeitos da resinagem só começaram a ser observados na campanha de 2020-2021, devido ao ciclo reprodutivo de três anos. Os dados mostraram grande variabilidade interanual: algumas árvores registaram em média sete pinhas por árvore, enquanto noutras campanhas chegaram a ser contabilizadas 35 pinhas por árvore.
Na análise comparativa, verificou-se que a parcela não resinada produziu consistentemente menos pinhas do que a resinada, embora sem inversões claras de tendência. Em termos de peso médio da pinha, a situação foi variável: em 2021 a não resinada registou valores mais altos, mas em 2022 a resinada voltou a liderar.
“Não é possível afirmar que a resinagem aumente ou diminua a produção. O que podemos concluir é que, até agora, não houve indícios de impacto negativo significativo”, resumiu Soares.
Qualidade e composição dos pinhões
Paralelamente, análises por espectroscopia no infravermelho próximo revelaram que não há diferenças significativas na composição química entre pinhões de árvores resinadas e não resinadas. Em ambos os casos, os principais constituintes mantiveram-se os mesmos – lípidos e proteínas. A maior variação foi observada não entre árvores resinadas e não resinadas, mas entre pinhas de uma mesma árvore.
Rendimento em pinhão branco
Foi ainda avaliado o rendimento em pinhão branco relativamente ao peso verde da pinha, com resultados que sugerem valores ligeiramente superiores em árvores resinadas. No entanto, os investigadores alertam que seriam necessárias medições prévias à resinagem para confirmar que este efeito não corresponde apenas a diferenças naturais pré-existentes.
Conclusões provisórias
Apesar das limitações metodológicas e da forte variabilidade interanual, os ensaios realizados reforçam a ideia de que a resinagem no Pinheiro-manso não compromete a produção de pinha nem a qualidade do pinhão. Para os proprietários, isto significa a possibilidade de diversificar rendimentos, associando duas produções de elevado valor económico.
“Mesmo que a produção de pinha se mantenha estável, já é uma vantagem. Significa que o produtor pode ter duas fontes de rendimento sem comprometer a fileira tradicional do manso”, concluiu Paula Soares.