Soluções para o problema da segurança na propriedade rural
Casa cheia e muita indignação no Colóquio “A Segurança na Propriedade Privada” organizado em Ponte de Sor pela AFLOSOR. O aumento de 90% no número de ocorrências em 2024, especialmente de roubos de cortiça, levou a Associação dos Produtores Agro-Florestais da Região de Ponte de Sor, filiada na UNAC, a promover este ano um debate para sensibilização sobre o tema e discussão de possíveis soluções a implementar.
Dados recolhidos pela AFLOSOR para a preparação desta iniciativa, junto de 146 proprietários, revelam que o problema está longe de ser residual, afetando uma parte significativa dos inquiridos, com danos económicos, patrimoniais e ambientais.
Um retrato atual da situação
57% dos participantes no inquérito afirmam ter sofrido, nos últimos três anos, roubos de cortiça; um em cada três foi alvo de assaltos a pinhas; e 12% confirmaram ter sido vítimas de roubos de gado. No entanto, apenas metade dos lesados em roubos de cortiça diz ter apresentado queixa às autoridades — número que desce ainda mais entre os afetados por roubos de gado e pinhas, dos quais apenas um em cada três comunicou a ocorrência. Mais de 50% dos inquiridos considera inútil fazer queixa, um em cada três optou por não o fazer por se tratarem de pequenos furtos e 7% afirma não ter denunciado a situação por receio.
Ainda segundo estes dados, no que diz respeito aos roubos de cortiça, os concelhos mais afetados foram Coruche e Ponte de Sor, seguidos pela Chamusca. Mora, Almeirim, Alpiarça, Gavião, Avis, Crato, Santarém e Abrantes, entre outros, também foram atingidos.
A perspetiva dos proprietários
O primeiro painel do colóquio deu voz a representantes dos proprietários, que se fizeram representar por três associações de produtores florestais filiadas na UNAC: a APFC de Coruche, a ANSUB de Alcácer do Sal e a ACHAR da Chamusca, acompanhadas ainda pela APORMOR — Associação dos Produtores do Mundo Rural da Região de Montemor-o-Novo.
Sobre os roubos de cortiça, Rita Bonacho, da APFC, sublinhou que estes assaltos vão muito além das quantidades subtraídas e geram inúmeros outros prejuízos que afetam a capacidade produtiva da floresta, causando danos graves nas árvores que comprometem o seu futuro, além de estragos na biodiversidade dos locais afetados.
Em representação da ANSUB, Pedro Pacheco Marques acrescentou que os danos se estendem também aos pinheiros e às vedações, entre outros prejuízos, que acompanham novos métodos de roubo que surgem todos os anos. Por exemplo, nas regiões costeiras, já acontece atualmente o escoamento dos produtos roubados por via marítima. No seu entender, é fundamental investigar para onde vai o produto destes furtos e quem são os recetadores neste mercado paralelo.
Em nome da ACHAR, Rui Igreja apontou a desertificação dos territórios do interior como causa da crescente insegurança nos espaços rurais, que, com cada vez menos habitantes, se tornam mais vulneráveis. Como sugestões para o futuro, propôs o condicionamento do acesso a caminhos públicos mediante apresentação de credenciais próprias ou a criação, no âmbito do PEPAC, de incentivos que comparticipem a aquisição de seguros e tecnologia para reforço da segurança.
A importância de fazer queixa
Para os representantes das várias associações presentes, os procedimentos de queixa devem ser simplificados, de modo a incentivar as pessoas a sinalizarem cada vez mais estas situações, dando maior visibilidade ao problema, que de outra forma tende a não ser reconhecido. Todos concordaram também que há muito a melhorar nos processos legais, que frequentemente acabam arquivados por falta de enquadramento adequado, criando um sentimento geral de impunidade.
Neste contexto, Rita Bonacho, da APFC, defendeu alterações na atual moldura penal dos roubos de cortiça, para que estes passem a ser considerados “crimes ambientais”, em coerência com o reconhecimento do sobreiro como “Árvore Nacional”, reforçando assim a defesa dos montados e do seu habitat.
Outra sugestão que mereceu o apoio geral foi a obrigatoriedade de apresentação de guias de transporte com faturas anexas, com possibilidade de cruzamento com a Autoridade Tributária.
Destaque-se, finalmente, nesta linha de prevenção, as inúmeras sugestões de utilização de câmaras de vigilância, drones e outros recursos tecnológicos para reforçar a segurança das propriedades.
O ponto de vista dos decisores e autoridades
Para o secretário-geral da CAP, só com a colaboração entre todos os envolvidos será possível resolver o problema da segurança no espaço rural, que não se limita apenas a algumas regiões, mas é transversal a todo o país.
Participando no segundo painel do colóquio, Luís Mira reforçou o apelo para que todos os afetados façam queixa, de modo a que exista um retrato oficial da gravidade da situação. Pediu ainda um foco particular nos recetadores dos produtos roubados, que — todos concordaram — estarão bem organizados e não serão muitos.
Em nome da Direção Regional do Alentejo do ICNF, José Calado concordou que pode haver base para, em algumas situações, se trabalhar num novo enquadramento legal de “crimes ambientais”. Defendeu ainda que devem ser considerados como dano não apenas o valor do produto roubado, mas todas as outras perdas associadas ao furto, que podem aumentar muito o prejuízo dos proprietários e devem também ser reconhecidas e penalizadas.
Por sua vez, Paulo Barbosa, diretor da Unidade de Desenvolvimento Rural e Licenciamentos da CCDR Alentejo, apontou a importância de se aperfeiçoar a legislação, de modo a permitir a produção mais fácil de prova relativamente a estes crimes. Garantiu ainda que a CCDR está atenta à situação e ao aumento da sofisticação destes assaltos, que devem ser comunicados por todos às autoridades.
Por último, em nome do Destacamento Territorial de Ponte de Sor, o Capitão Francisco Carvalho reconheceu que os meios de prova previstos na legislação ainda impedem muitas vezes que os processos sejam eficazes e tenham as devidas consequências, motivo pelo qual devem ser revistos. Deixou ainda um apelo aos proprietários para que sejam proativos e tomem todas as medidas dissuasoras que estiverem ao seu alcance.